A PEDAGOGIA DA AUTONOMIA...

RESENHA - PEDAGOGIA DA AUTONOMIA

De: Paulo Freire


Freire introduz Pedagogia da autonomia explicando suas razões para analisar a prática pedagógica do professor em relação a autonomia de ser e de saber do educando. Enfatiza a necessidade de respeito ao conhecimento que o aluno traz para a escola, visto ser ele um sujeito social e histórico, e da compreensão de que “formar é muito mais do que puramente treinar o educando no desempenho das destrezas”... (p.. 15). Define essa postura como ética e defende a idéia de que o educador deve buscar essa ética, a qual chama de “ética universal do ser humano” (p. 16), essencial para o trabalho docente.
Não podemos nos assumir como sujeitos de procura, da decisão, da ruptura, da opção, como sujeitos históricos, transformadores, a não ser assumindo-nos como sujeitos éticos (...) É por esta ética inseparável da prática educativa, não a importa se trabalharmos com crianças, jovens ou com adultos, que devemos lutar (p. 17 e 19).
Em sua análise menciona alguns itens que considera fundamentais para a prática docente, enquanto instiga o leitor a criticá-lo e acrescentar a seu trabalho outros pontos importantes. Inicia afirmando que “não há docência sem discência” (p. 23), pois “quem forma se forma e reforma ao formar, e quem é formado forma-se e forma ao ser formado” (p. 25). Dessa forma, deixa claro que o ensino não depende exclusivamente do professor, assim como a aprendizagem não é algo apenas de aluno. “não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto um do outro. Quem ensina aprende ao ensinar, e quem aprende ensina ao aprender” (p. 25).
Justifica assim o pensamento de que o professor não é superior, melhor ou mais inteligente, porque domina conhecimentos que o educando ainda não domina, mas é, como o aluno, participante do mesmo processo da construção da aprendizagem.
Segue sua análise colocando como absolutamente necessário o rigor metódico e intelectual que o educador deve desenvolve em si próprio, como pesquisador, sujeito curioso, que busca o saber e o assimila de uma forma crítica, não ingênua, com questionamentos, e orienta seus educandos a seguirem também essa linha metodológica de estudar e entender o mundo, relacionando os conhecimentos adquiridos com a realidade de sua vida, sua cidade, seu meio social. Afirma que “não ensino sem pesquisa nem pesquisa ensino” (p. 32). Esse pesquisar, buscar e compreender criticamente só ocorrerá se o professor souber pensar. Para Freire, saber pensar é duvidar de suas próprias certezas, questionar suas verdades. Se o docente faz isso, terá facilidade de desenvolver em seus alunos o mesmo espírito.
O professor que pensa certo deixa transparecer aos educandos que uma das bonitezas de nossa maneira de estar no mundo e com o mundo, como seres históricos, é a capacidade de, intervindo no mundo, conhecer o mundo (...) Ensinar, aprender e pesquisar, lidam com dois momentos: o em que se aprende o conhecimento já existente e o que se trabalha a produção do conhecimento ainda não existente (p. 31).
Ensinar, para Freire, requer aceitar os riscos do desafio do novo enquanto inovador, enriquecedor, e rejeitar quaisquer formas de discriminação que separe as pessoas em raça, classes... É ter certeza de que faz parte de um processo inconcluso, apesar de saber que o ser humano é um ser condicionado, portanto há sempre possibilidades de interferir na realidade afim de modificá-lo. Acima de tudo, ensinar exige respeito à autonomia do ser educando. O respeito à autonomia e à dignidade de cada um é imperativo ético e não um favor que podemos por não conceder uns aos outros (...) O professor que desrespeita a curiosidade do educando, no seu gosto estético, a sua inquietude, a sua linguagem, mais precisamente a sua sintaxe e a sua prosódia; o professor que ironiza o aluno, que o minimiza, que manda que “ele se ponha em seu lugar” a um mais tênue sinal de sua rebeldia legítima, tanto quanto o professor que se exime do cumprimento do seu dever de propor limites à liberdade do aluno, que se furta ao dever de ensinar, de estar respeitosamente à experiência formadora do educando, transgride os princípios fundamentalmente éticos de nossa existência (p. 66).
É importante que professores e alunos sejam curiosos, instigadores. “É preciso, indispensável mesmo, que o professor se ache repousado no saber de que a pedra fundamental é a curiosidade do ser humano” (p.96). faz-se necessário, portanto, que se proporcione momentos para experiências, para buscas. O professor precisa estar disposto a ouvir, a dialogar, a fazer de suas aulas momentos de liberdade para falar, debater e ser aberto para compreender o querer dos seus alunos. Para tanto é preciso querer bem, gostar do trabalho e do educando. Não com um gostar ou um querer bem ingênuo, que permite atitudes erradas e não impõe limites, ou que sente pena da situação de menos experiente do aluno, ou ainda que deixa tudo como está que o tempo resolve, mas um querer bem pelo ser humano em desenvolvimento que está ao seu lado, a ponto de dedicar-se doar-se e de trocar experiências, e um gostar de aprender e de incentivar a aprendizagem, um sentir prazer em ver o aluno descobrindo o conhecimento.
É digna de nota a capacidade que tem a experiência pedagógica para despertar, estimular e desenvolver em nós o gosto de querer bem, e o gosto da alegria sem a qual a prática educativa perde o sentido. É esta força misteriosa, as vezes chamada de vocação, que explica a quase devoção com que a grande maioria do magistério nele permanece, apesar da imoralidade dos salários. E não apenas permanece, mas cumpre, como pode, seu dever (p. 161).
Nessa obra portanto, expondo os sabores que considera necessários à prática docente, Paulo Freire oriente ao mesmo tempo em que incentiva os educadores e educadoras a refletirem sobre seus fazeres pedagógicos, modificando aquilo que acharem preciso, mas especialmente aperfeiçoando o trabalho, além de fazer a cada dia a opção pelo melhor, possibilidades de mudanças daquilo que sua visão necessita mudar.

Jorge Schemes - Teólogo e Psicopedagogo.

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